domingo, 23 de outubro de 2016

O SILÊNCIO CONIVENTE DA OMISSÃO

                                                                       Neimar de Barros

Estou à procura de um ombro e por incrível que pareça não encontro.
As pessoas têm dois ombros recebidos gratuitamente e não me emprestam um...
Não quero possuir, quero emprestado! Quero um ombro pra servir de apoio
Para a cabeça pesada de problemas e cambaleante.
Um ombro para recostar e pensar nas contradições de um dia confuso.
Um ombro-travesseiro, descansando o cansaço.
Preciso matar dúvidas, preciso de um sopro de maturidade e não o silêncio conivente da omissão.

... E vejo mamãe empolgada com a vida particular de um ator
E papai falando com sabedoria sobre cifras e preocupações políticas...
Nenhum dos dois para, ninguém para pra saber que eu também sou importante.
Mais importante que as alienações que eles criam para fugir da responsabilidade de ser.
Sou mais importante que a novela, os móveis, o tapete, a maquiagem, a mesada...
Sou mais importante que a guerra no exterior, o futebol, o jornal, o carro, a bebida...
Sou mais importante porque sou gente,
E por incrível que pareça não existem ombros ao meu alcance.

Quando saí do colo, eu acho que saí do mapa do amor.
Deixei de ser engraçadinho para ser problema,
Problema porque agora sei o que é real, sei o que é falso...
E eu quero um ombro real! E não um colo falso!
Preciso ouvir a experiência do passado e não somente a acusação de que estou errado.

Falem comigo. E não me apresentem apenas um dedo em riste.
Não adianta apontar-me erros se eu não me deparar com os seus acertos.
Não adianta gritar, proibir, apontar o olho da rua.
Não adianta dizer que sabem tudo
Se não souberem que eu preciso de um ombro,

Não adianta dizer que já passaram por isso
Se sadicamente ficarem me esperando cair também.
Não adianta monólogos, eu preciso de diálogos.
Eu preciso de ouvidos humildes e palavras tranquilas!
Eu quero um ombro pra encostar minha cabeça tonta
E falar dos meus estudos, trabalhos, namoro.

Quero informações e não mentiras sobre sexo, Deus, sociedade.
Quero um ombro porque estou confuso
Preciso errar menos, sentindo o aroma do exemplo,
Chega de “Faça o que eu mando e não o que eu faço!”
Quero um ombro pra chorar a fuga da sinceridade de certos adultos.

Preciso ver testemunhos e não apenas lê-los.
Chega de papo-furado, chega de divagações.
Eu quero o caminho, a verdade, a vida!
Eu quero as pegadas de Cristo: Na rua, em casa... Dentro de nós...


Comentário por Simone Carvalho :


Neimar de Barros, (poeta brasileiro, de Corumbá/MS, faleceu em 2012).

Esta poesia “No Silêncio Conivente da Omissão” foi escrita nos anos setenta. Tudo era diferente de hoje, no sentido de que naquele tempo não havia esta tecnologia tão avançada.

A poesia de Neimar nos mostra um pedido de socorro de um jovem adolescente, que poderia ser transportada para os dias de hoje, tranquilamente!  Ele necessita de um “ombro” para descansar. Na verdade ele quer falar, perguntar. Ele quer ser ouvido. Quer respostas para suas dúvidas. E os adultos ao seu redor, incluindo seus pais, estão ocupados demais com coisas supérfluas. Ninguém para pra ouvi-lo. Todos estão distraídos com outros assuntos e não percebem a angústia que domina o coração desse jovem. E há mil perguntas na cabeça dele... Mil dúvidas...

Transportando para os dias de hoje, poderíamos imaginar um jovem na mesma dificuldade, tendo os adultos ao seu redor, ligados em seus celulares, respondendo e-mails, mandando mensagens de whatsApp, distraídos com seus laptops, etc. e ninguém para ouvir as suas perguntas. Ninguém para falar-lhe da “experiência do passado”. Ninguém para emprestar-lhe um ombro onde ele possa “recostar e pensar nas contradições de um dia confuso”.

Mensagem clara que atinge o coração.


Eu amo poesia! 

Um comentário:

  1. Tive este livro a tempos atrás e buscava informação sobre ele. Obrigada por possibilitar reviver essas leituras.

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